Foi meio por acaso que comecei, trinta anos atrás, a trabalhar com coisas relacionadas à Argentina — e não, leitor, não direi aqui que coisas são essas, mas esclareço que estão dentro da legalidade e fora do universo das comidas.
Por acaso e por sorte.
E, por necessidade e por sorte, passei longas temporadas em Buenos Aires, entre 1989 e 1991. Me hospedava na Calle Esmeralda e trabalhava, quase diariamente, na Calle México. Fazia o trajeto a pé porque este é o melhor meio de locomoção por lá — melhor, inclusive, porque mais prazeroso.
No caminho, já no encontro de Florida com Corrientes, havia uma churrería. A palavra não existe em português (e, por favor, não criem: já estamos fartos do uso abusivo e horrível dos sufixos –eria e –aria em estabelecimentos que comercializam comidas), pero en español sí, existe.
Era lá que me abastecia, com preocupante regularidade, na ida para o trabalho (onde não podia entrar com alimentos) ou na volta para casa. Também comia churros em outras partes, por supuesto, e quase me tornei churro-adicto.
Mudam-se os tempos, mudam-se os trabalhos e, embora eu continue predominantemente dedicado a coisas argentinas, ir a Buenos Aires é raro, raríssimo. Ano passado fui e voltei decepcionado, entre outras coisas, com os churros. Meia dúzia de tentativas e 100% de fracasso.
Em São Paulo, o panorama tampouco é estimulante. Muitos churros horríveis e três razoáveis — Adega Santiago, Dona Onça e Venga —, mas estapafurdiamente caros; afinal, são churros, apenas churros.
Eis que ouço dizer que abriu uma churrería relativamente perto de casa, na Avenida São Gabriel. No mesmo dia, o encanador me informa que eu teria que comprar uma peça que, nas imediações, só se achava na… São Gabriel.
Não resisti ao complô cósmico-hidráulico e lá fui eu. A peça, não achei: o banheiro de minha filha continuará interditado por mais uns dias. Mas os churros, achei. Uma porta só, lugar pequeno e agradável, atendimento gentil.
Comi uma porção dos churros espanhóis — versão que prefiro aos recheados. Finos, secos e crocantes por fora, úmidos e macios por dentro (note bem: úmidos e macios, não crus, como tantos que encontramos nas boas e nas não tão boas casas do ramo). Massa discretamente salgada. Bons, muito bons. Só comparáveis aos meus velhos companheiros buenaerenses.
Voltei para casa com o sorriso que não tinha encontrado desde que acordara e, mais uma vez, entendi o óbvio. Que a verdade das comidas — e da vida em geral — está nessas coisas, pequenas coisas. Um passado subitamente aprisionado, o prazer de uns minutos diante de um doce, de um quadro, de um livro. Nessas pequenas coisas, grandes coisas.
La Churrería
Avenida São Gabriel, 549, Itaim, SP
tel. 11 2619 2054
12/07/2013 às 16:45
Muito bom!
Comigo passa o mesmo só que com as carnes, vivi em bsas de 89 a 92..andava muito pela calle esmeralda y tucuman, comia no Don Pepone ao lado Banespa. Mas hoje e coincidentemente estou na Argentina a passeio, nao consigo mais comer aquela carne maravilhosa de anos atras, apesar dos preços astronomicos, por aqui! Provavelmente deve ser culpa do Varanda Grill, Rubayat, Dinhos entre outros… Acabamos, nós moradores e comedores em SP, aumentando muito a nossa régua de avaliaçāo! Abs e parabens pelo post!
12/07/2013 às 16:58
Comprando a passagem…
12/07/2013 às 18:27
José,
obrigado.
O tempo passou e, acho, nossos gostos amadureceram.
No caso das carnes, o panorama paulistano melhorou muitíssimo – tanto na qualidade das carnes, quanto no preparo.
Abraços!
Cris,
venha!
Beijos!
13/07/2013 às 08:58
Me parece que o empenho em achar os churros talvez tenha desviado a atencao de achar a tal peca… Faria o mesmo. 🙂 Otimo texto!
13/07/2013 às 15:48
Gustavo,
obrigado.
Felizmente uma coisa era praticamente ao lado da outra. rs
Abraços!
15/07/2013 às 18:04
alhos,
obrigado pelo post.
o prazer de ler teus textos é comparável ao de degustar estas pequenas maravilhas, sejam elas churros (que também adoro) ou não.
abraço do avestruz
16/07/2013 às 09:47
Churros no caminho para o meu trabalho ? Eu não precisava saber disto…adeus tentativas desesperadas de manter uma circunferência abdominal decente…
Forte abraço!
16/07/2013 às 22:42
Me lembro de ter comido uns churros gostosos no Na cozinha numa passada por SP
19/07/2013 às 10:58
Gustavo,
ficamos muito felizes com seu post!
Gostamos também que sua experiência tenha sido tão positiva na Churreria, porque tem relação com sua história.
Muito obrigada, de verdade.
Apareça sempre!
Um abraço
Celso & Thaís
20/07/2013 às 22:49
Avestruz,
muito obrigado!
Abraços!
Wair,
pois é… E bem próximo da escola da minha filha… rs
Abraços!
Tádzio,
tudo bem?
Obrigado pela dica. Nunca comi churros lá.
Abraços!
Celso & Thaís,
muito sucesso para a Churrería, que tenha vida longa.
Apenas uma observação: não me chamo Gustavo – Gustavo é o nome de um dos leitores que comentou o post.
Abraços!
29/07/2013 às 22:23
Um churros que achei bom foi o do Veloso. Já provou?
02/08/2013 às 11:42
Ricardo,
tudo bem?
Nunca comi. Tentarei corrigir a falha. rs
Obrigado pela dica.
Abraços!