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Almoço executivo

11/08/2011

 

 

Tenho que reconhecer: a sugestão indireta desse texto veio de um amigo — iniciais A.B. Obrigado!

Um belo dia, em meio a conversações tuiteiras, ele arrematou: ‘Quer conhecer a cozinha do restaurante sem pagar muito? Coma o almoço executivo.’

Na hora em que li não tive propriamente a ideia de fazer uma ronda de almoços executivos. Poucas semanas depois, no entanto, os acasos da sorte me levaram a ela.

Não sei bem a quantos restaurantes fui. Muitos. Algumas anotações perdi, outras preferiria ter perdido.

Ao final de tantos almoços, concluí que A.B. tinha razão. Quase sempre é possível ter uma boa noção do trabalho feito na casa a partir do exemplo que o almoço executivo dá. Mais: dá para perceber com facilidade que restaurantes de fato o valorizam e quais o depreciam.

É mais ou menos óbvio que alguém que opta por um almoço executivo não pretende demorar muito, nem gastar demais. Também é óbvio que, para o restaurante, o almoço executivo pode ser uma forma de atrair novos clientes, expor a qualidade do próprio trabalho ou apenas um recurso ágil para aumentar seus ganhos.

Por tudo isso, a questão dos preços é séria. Para não ter surpresa na hora da conta e pagar quase o dobro do que pretendia, o comensal deve ficar atento a alguns detalhes.

O couvert, por exemplo. Ele está incluído no preço? Se a informação não constar do cardápio, pergunte. Raros garçons têm o bom hábito de informar voluntariamente. Se não for parte do cardápio executivo, a sugestão é simples: recuse. Mesmo quando bons, aqueles pãezinhos podem representar um acréscimo significativo na conta.

E as bebidas? Num almoço que custa trinta e poucos reais, faz sentido pagar quase dez por uma cerveja ou oito por um suco? Parece-me que não, mas a decisão, sempre, é do cliente. Importante é que ele saiba o quanto está pagando por aquela bebida aparentemente inocente e que fique atento porque, em algumas casas, os garçons esvaziam rapidamente as garrafas de água e trazem logo outras para a mesa.

As anotações abaixo se referem a cinco exemplos típicos. Eles estão em ordem alfabética. Um é sensacional, outro é bastante bom e generoso. E três deles não deixaram saudade.

Por fim, duas observações. Os preços indicados correspondem ao gasto de duas pessoas. Todas as refeições foram acompanhadas com água.

 

 

* O almoço executivo do Antiquarius ilustra bem o estilo da comida da casa.

Abriu com um couvert simplificado, agradável e incluído no preço.

Entre as opções de entrada, ficamos com a cremosíssima (e pesadíssima) tigelinha de bacalhau. Um erro.

Dos principais, arroz de polvo e arroz de pato. Porções grandes e, sobretudo, pesadas. Difícil ultrapassar a metade de ambos.

De sobremesa, um dos doces da casa — a maioria é de origem conventual e com presença marcante de açúcar.

Conta: 168

 

* O almoço executivo do Arturito decepcionou.

Um agradável couvert — pães quentinhos e azeite com azeitonas, alecrim, pimenta e parmesão — deu a boa largada. Só depois soubemos que era cobrado à parte.

Depois, a salada de verdes, feitos na lenha, trouxe ótima abóbora. O prato, porém, era minúsculo.

Os principais desafinaram totalmente: a barriga de porco braseada estava irregular: um lado macio, o outro extremamente rijo. O frango no forno a lenha era insosso, o alecrim prevalecia claramente e encobria os demais sabores.

De sobremesa, bom crepe brûlé com toque de laranja, recheado de doce de leite queimado e muito (muito!) doce, acompanhado de chantilly.

Conta: 130

 

* O almoço executivo do Boa também ficou aquém do que esperávamos.

O creme de inhame e castanha do Pará estava insosso.

A outra entrada — cuscuz marroquino com manga, pimenta rosa, redução de vinho e raspas de limão — era interessante, mas o limão se impunha de forma contundente aos demais sabores.

A mesma falta de gosto do creme de inhame se manifestou nos dois pratos principais: grão de bico com calabresa, lentilhas, costelinha defumada e aioli; wok de peixe, gengibre e leite de coco. Por escrito, ambos os pratos prometiam sabores intensos. Na prática, eram inexpressivos.

As sobremesas não mudaram o rumo da refeição. Banana assada correta com calda de chocolate, laranja com espuma de chá.

Conta: 88

 

* Se algum almoço executivo merece ser celebrado pela combinação entre alta qualidade e grande quantidade é o do Dalva & Dito.

Começou com uma agradável salada de folhas verdes, tomate, cenoura e palmito.

Em seguida, foram dispostos potinhos de acompanhamentos: arroz branco, feijões (roxinho e preto), couve, farofa, batatas.

E chegaram quatro carnes: galeto, mignon, pernil e costelinha de porco.

A princípio, achamos que devíamos escolher uma delas. Não. As quatro vêm sempre à mesa — se você quiser (e conseguir).

Curiosamente a melhor delas era o mignon. Todas, no entanto, estavam bem preparadas e foi necessário, óbvio, recusar parte do que esperavam que comêssemos.

Conta: 140

 

* O almoço executivo do Epice… Ah, o almoço executivo do Epice.

O couvert, incluído no preço, traz ótimos pães, manteiga, azeite e sal. Também a água, ressalte-se, não é cobrada à parte — nem tem aquele gosto forte de cloro de algumas águas oferecidas gratuitamente por restaurantes.

Entradas, principais e sobremesas ofereceram um painel preciso da proposta da casa e da inventividade do chef.

Começamos com salmão curado com aspargos e salada verde e mexilhão com salada de beterraba e agrião.

Prosseguimos com o pargo acompanhado de purê de limão, alho porró e cuscuz marroquino e com a barriga de porco com purê de batata e cenoura.

As sobremesas: morango com sorbet de morango e creme inglês e

sorbet de pêra.

Impossível destacar qualquer um dos pratos. Todos estavam excelentes. De longe, o melhor executivo que provamos. De longe.

Conta: 93

 

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SPRW: Antiquarius

03/09/2009

 

O Antiquarius é um dos restaurantes de clientela mais homogênea em São Paulo. Homogênea na faixa etária, na posição social, no estilo e até no vestuário. No almoço ou no jantar, o panorama se repete quase desde a fundação.

Por isso, o mais interessante da visita à casa nesta SPRW foi ver a incrível variação do público.

Enquanto esperávamos, ouvimos dois casais jovens conversarem sobre a formalidade do serviço. Temiam não saber como se comportar.

Numa mesa atrás de nós, quatro moças bebiam muito (muito!), falavam alto e uma delas, meio trôpega, chegou a quebrar uma taça. Uma hora ela se levantou, passou ao lado do garçom e sussurrou-lhe que gostaria de mais um pouco de vinho. Repreendida pela amiga, reagiu vigorosamente, ameaçando revelar como esta era “de verdade”.

À minha esquerda, três moços de camiseta, todos no início dos trinta, comiam os mesmos pratos e falavam de futebol, num ritmo de informalidade que contrastava com o ar sisudo do lugar.

À direita, quatro garotos – bandas de rock na camiseta larga e menos de vinte anos – discutiam e riam em meio a uma quantidade imensa de latas de Coca-Cola e Guaraná.

Minha mulher e eu almoçamos ouvindo vozes e notando personagens que, provavelmente, jamais cogitaram ir àquele restaurante e estavam aproveitando os preços baixos da RW.

No ambiente tradicional, soturno e carregado do Antiquarius, havia vida – porque vida é variação, é diferenciação. Pessoas de verdade, daquelas que encontramos na rua. Daquelas para quem uma visita a um restaurante famoso é evento para ser lembrado por muito tempo. Gente de todos os estilos, roupas e idades.

Entendemos, naquele instante, o significado de uma Restaurante Week. Descobrimos também como existe gente disposta a freqüentar restaurantes, bastando, para isso, que os preços sejam acessíveis.

Este, o lado feliz de nosso almoço no Antiquarius.

Nota ao leitor

Havia duas possibilidades para comentar nossa visita: mostrar o lado feliz por meio de uma perspectiva, digamos, etnográfica ou falar da refeição em si. Preferi a primeira.

Se tivesse optado pela segunda, reclamaria de algumas coisas:

– da rispidez da encarregada da reserva;

– do desrespeito à reserva (reserva-se para chegar e sentar, não para ter direito “à próxima mesa de dois que liberar” – o que aconteceria em 25 minutos);

– da estapafúrdia sugestão (que está sendo colocada em prática) de reunir grupos diferentes numa mesma mesa para “agilizar a espera” (fiquei pensando se proporiam isto à clientela regular da casa);

– da temperatura (bem fria) e da consistência (puxa-puxa) da tigelinha de bacalhau da entrada;

– do arroz quase empapado com cordeiro cozido muito além do ponto do “arroz de cordeiro”;

– da batata-palha amolecida do “bacalhau Antiquarius”, do bacalhau seco, rijo e aparentemente bem distinto do que é normalmente servido na casa;

– da taça grosseira de vidro em que serviram meu vinho (minha mulher ficou lisonjeada por receber uma de cristal);

– do garçom destacar que a taça de vinho era “dez real” (sic);

– da taça de vinho servida não ultrapassar 100 ml;

– do café mal tirado, com borda queimada;

– da ausência de açúcar para o café (ok, minha mulher e eu não adoçamos o café, mas como eles sabiam disso?);

– dos muitos cacos de vidro que ficaram no chão (lembram-se que a moça quebrou a taça?), sobre os quais a cliente da mesa ao lado teve que passar, com cuidado;

– de alguns cacos de vidro, nada pequenos, que continuaram no chão depois que o maître determinou a limpeza do lugar.

Para evitar ter que falar de tudo isso, preferi falar do público.


Antiquarius

Alameda Lorena, 1884, Jardim Paulista, SP

Tel.  11  3082 3015

Como chegar lá (Guia 4 Cantos): Antiquarius