Estamos em plena época de rótulos – não os das embalagens, nem aqueles que os companheiros dos anos 60 impunham a quem não os espelhava.
Rótulos para restaurantes. Uns assumem o que querem, outros recebem o que não querem.
E, de rótulo em rótulo, o comilão comum fica sem saber exatamente o que é um restaurante, digamos, “contemporâneo”. Ou é forçado a reunir, sob um mesmo título (só para não repetir a palavra “rótulo” – epa, repeti), casas muitíssimo diferentes.
Na prática, eles funcionam, e são inevitáveis, para organizar guias e para definir espaços no amplo e confuso universo gastronômico paulistano.
É o caso, me parece, dos restaurantes “brasileiros”.
Não, não se preocupe: não vou discutir, pela enésima vez, o conceito e os possíveis sentidos de brasilidade gastronômica.
Mas o termo se aplica a restaurantes tão diferentes que chega a incomodar. Vale para os regionais e vale para o D.O.M. (que também é chamado de contemporâneo). Vale para o Mocotó e para o Soteropolitano. Para o Sinhá e para Dalva & Dito.
De alguns destes gosto um pouco mais (nome aos bois? D.O.M e Sinhá, cada um, é claro, no seu estilo e com sua proposta); de outros, um pouco menos. Na verdade, não são comparáveis.
Só que quando penso em restaurante “brasileiro” são outros dois que me vêm à cabeça, comparáveis e excelentes. Tordesilhas e Brasil a gosto.
Do Tordesilhas, que conheço desde a abertura e que freqüentava com meus pais, já falei aqui no blog. Do Brasil a gosto, que me lembre, nunca.
E cada vez são melhores as refeições que faço lá. O trabalho de Ana Luiza Trajano, que sempre foi consistente, parece cada mais claro e… saboroso.
Há coisa de duas semanas, voltamos. Fácil de estacionar (na Barão de Capanema, antes de virar, e sem chegar aos agitados quarteirões seguintes), ruazinha agradável por onde caminhamos até a porta da casa – bonita e discretamente elegante.
Recusamos o couvert e ficamos com a seleção de petiscos da entrada: tapioca com siri mole, queijo coalho com melaço, canapé com banana e geléia de pimenta, pastel de pirarucu e croquete de carne seca. Tudo bom, especialmente o pastel (embora um pouco salgado demais). O croquete estava tão bom que pedimos, face à inflamada campanha de minha filha, uma porção só dele.
De principal, minha mulher escolheu a pescada cambucu com vatapá e mini-acarajés. De novo, o sal apareceu mais do que deveria, mas não chegou a comprometer o bom resultado e o sabor do peixe e dos acompanhamentos.
Preferi o pirarucu (na verdade, já sai de casa pensando nele) com purês de batata doce e de abóbora, calda de coco e gengibre, raspas largas de coco. Delicioso. Pirarucu assim só comi no Lá em casa, de Belém.
Conforme havíamos pedido, o prato de minha filha – divisão dos nossos – já veio montado e muito bem decorado. Serviço gentil e atencioso conta muito – sobretudo quando se vai a restaurante com criança. Ela não se fez de rogada e, no habitual estilo orca, devorou vigorosamente os peixes.
A sobremesa de minha filha foi o ótimo e crocante sorvete de coco queimado; a de minha mulher, a cocada líqüida com sorbet de limão (ótima idéia e sabor, um pouco doce demais); eu, a tortinha de chocolate com geléia de bacuri e calda de pitanga: excelente.
Tomamos águas e um EQ Chardonnay a preço justo (123). O café, não espresso, era dispensável. Conta: 400.
Restaurante brasileiro? Sim, se considerarmos os ingredientes e a disposição de integrar elementos de cozinhas regionais variadas. Principalmente se pensarmos que há, explicitamente, um esforço grande de pesquisar e de entender a miríade de referências que podem fazer parte da brasilidade – se ela de fato existir.
Taí, não resisto ao trocadilho: gosto do Brasil do Brasil a gosto.
Brasil a gosto
Rua Professor Azevedo Amaral, 50, Jardim Paulista, SP
Tel. 11 3086 3565
Como chegar lá (Guia 4 Cantos): Brasil a gosto