Alguns restaurantes têm seu tempo, outros conseguem transcendê-lo.
Quando o Carlota abriu, uns quinze anos atrás, virou uma febre. Tudo ali parecia novidade. A tal da culinária contemporânea mostrava sua cara, embora ninguém soubesse exatamente a que a etiqueta se referia.
Havia, porém, certeza quanto ao talento e à técnica de Carla Pernambuco, ao acerto das combinações e fusões de sabores, procedimentos e ingredientes.
Mudaram-se os tempos, mudaram-se as vontades.
De uns anos para cá, as críticas ao Carlota só cresceram nos meios gastronômicos. Explicações de toda ordem para o declínio da casa foram formuladas.
Parecia que o tempo do restaurante havia se encerrado. Só quem não sabia disso era o público, que continuava a ocupar regularmente os salões, agora mais amplos, da casa da rua Sergipe.
Apesar de nunca ter escrito sobre o Carlota, confesso que compartilhei silenciosamente muitas críticas: fui lá três vezes nos últimos dois anos e, em todas, saí decepcionado.
Ontem minha mulher e eu resolvemos voltar.
Cautelosamente, pedimos uma porção de bolinhos de mandioca com camarão de entrada. Sequinha, crocante, recheio cremoso, pimentinha interessante ao lado. A mandioca, agradabilíssima. O camarão, sem gosto.
Os pescados prevalecem no cardápio; fora eles, há apenas seis opções de carnes, sendo cinco de boi. Achamos melhor ficar com os peixes.
Por isso, nossos principais foram um linguado ao molho de “queijo de cabra dourado” acompanhado de fettuccine de pupunha e cogumelos, e lulas grelhadas com riso de camarão e brie.
O sabor de queijo de cabra era quase imperceptível na cobertura do linguado e as lulas chegaram à mesa um pouco mais rijas do que deveriam.
Os acompanhamentos dos dois pratos estavam, no geral, superiores: bom fettuccine de pupunha, ótimo riso de camarão e brie (o camarão, nesse caso, era bastante saboroso).
Para a sobremesa, pudim de fruta do conde. Apresentação feia, de cores apagadas, mas gostoso e leve.
Conclusão? Creio que o Carlota não acabou, nem transcendeu seu tempo. Talvez a fórmula surpreendente de quinze anos atrás tenha sido decifrada e a concorrência melhorado significativamente.
Hoje é uma casa que consolidou seu lugar e onde se pode comer razoavelmente bem. Não empolga, nem se compara ao que São Paulo tem de melhor em gastronomia. Mas tampouco pode ser jogado — seja por seu passado, seja por seu presente — na vala comum da restauração ultrapassada.
Rua Sergipe, 753, Higienópolis, São Paulo
Tel. 11 3661 8670
Como chegar lá (Guia 4 Cantos): Carlota