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Churros!

12/07/2013

 

Foi meio por acaso que comecei, trinta anos atrás, a trabalhar com coisas relacionadas à Argentina — e não, leitor, não direi aqui que coisas são essas, mas esclareço que estão dentro da legalidade e fora do universo das comidas.

 

Por acaso e por sorte.

 

E, por necessidade e por sorte, passei longas temporadas em Buenos Aires, entre 1989 e 1991. Me hospedava na Calle Esmeralda e trabalhava, quase diariamente, na Calle México. Fazia o trajeto a pé porque este é o melhor meio de locomoção por lá — melhor, inclusive, porque mais prazeroso.

 

No caminho, já no encontro de Florida com Corrientes, havia uma churrería. A palavra não existe em português (e, por favor, não criem: já estamos fartos do uso abusivo e horrível dos sufixos –eria e –aria em estabelecimentos que comercializam comidas), pero en español sí, existe.

 

Era lá que me abastecia, com preocupante regularidade, na ida para o trabalho (onde não podia entrar com alimentos) ou na volta para casa. Também comia churros em outras partes, por supuesto, e quase me tornei churro-adicto.

 

Mudam-se os tempos, mudam-se os trabalhos e, embora eu continue predominantemente dedicado a coisas argentinas, ir a Buenos Aires é raro, raríssimo. Ano passado fui e voltei decepcionado, entre outras coisas, com os churros. Meia dúzia de tentativas e 100% de fracasso.

 

Em São Paulo, o panorama tampouco é estimulante. Muitos churros horríveis e três razoáveis — Adega Santiago, Dona Onça e Venga —, mas estapafurdiamente caros; afinal, são churros, apenas churros.

 

Eis que ouço dizer que abriu uma churrería relativamente perto de casa, na Avenida São Gabriel. No mesmo dia, o encanador me informa que eu teria que comprar uma peça que, nas imediações, só se achava na… São Gabriel.

 

Não resisti ao complô cósmico-hidráulico e lá fui eu. A peça, não achei: o banheiro de minha filha continuará interditado por mais uns dias. Mas os churros, achei. Uma porta só, lugar pequeno e agradável, atendimento gentil.

 

Comi uma porção dos churros espanhóis — versão que prefiro aos recheados. Finos, secos e crocantes por fora, úmidos e macios por dentro (note bem: úmidos e macios, não crus, como tantos que encontramos nas boas e nas não tão boas casas do ramo). Massa discretamente salgada. Bons, muito bons. Só comparáveis aos meus velhos companheiros buenaerenses.

 

Voltei para casa com o sorriso que não tinha encontrado desde que acordara e, mais uma vez, entendi o óbvio. Que a verdade das comidas — e da vida em geral — está nessas coisas, pequenas coisas. Um passado subitamente aprisionado, o prazer de uns minutos diante de um doce, de um quadro, de um livro. Nessas pequenas coisas, grandes coisas.

 

 

La Churrería

Avenida São Gabriel, 549, Itaim, SP

tel. 11 2619 2054