Experiência é bom, experiência é tudo.
Nem sempre.
Às vezes, experiência é amarra. Lanterna na popa, disse Coleridge: ilumina o passado, obscurece o futuro.
Quando se trata de visitas a restaurantes, um outro olhar — ou outro mastigar? — pode cair bem e mudar a impressão ruim ou boa que uma casa deixou.
Eu já tinha ido antes ao Vito. E, confesso, saíra de lá decepcionado, incomodado, constrangido. Nada dera certo: da comida à, digamos, atitude do pessoal.
Semana passada decidi: anestesiei a má lembrança e fiz reserva lá.
Dispensamos o couvert para comermos mais do cardápio.
Como primeiro prato, minha mulher e eu dividimos um ‘ravioli aberto’ com recheio de rabada. Duas lâminas de massa de agrião, saborosa rabada no meio. Marcante, consistente.
Enquanto isso minha filha atacava (com medida violência) o fettuccine com queijo de cabra, tomate e manjericão — o azeite trufado era dispensável. Massa saborosa feita na casa, bons ingredientes. Passou com louvor pelo rigoroso controle de qualidade do paladar de onze anos — e também pelos paladares mais, como dizer?, experientes dos pais.
O prato principal foi comido com dois garfos no mesmo prato: o garçom alertara que não daria para dividi-lo na cozinha, colocaria o prato entre minha mulher e mim. Prime rib no ponto, um pouco mais rijo do que poderia ser, mas muito bom.
Duas sobremesas: pannacotta del cielo, que é boa, mesmo sendo terrena. Ótimo panforte.
Atendimento simpático, gentil, eficaz: exorcizou fantasmas passados. E carta de vinho honesta: 106 reais por um Tenuta delle Terre Nere 2008 (78 na importadora).
Pois é, não vale a pena cultivar desconfortos, acreditar que o passado é uno e definitivo. É possível sempre colocá-lo em xeque e, com jeito, girar a lanterna da experiência para a frente.
Rua Pascoal Vita, 329, Vila Beatriz, SP
tel. 11 3032 1469
Como chegar lá (Guia 4 Cantos): Vito
[ps. depois de ler um dos comentários, que dizia não haver azeite trufado no fettuccine, fiquei encafifado. Voltei ao restaurante, ouvi o garçom declamar o ingrediente entre os que compunham o prato, voltei a pedi-lo, comi novamente, chamei o maître e perguntei: ele confirmou que o fettuccine levava azeite trufado.]